domingo, julho 24, 2005

Tirando o Pó



Com paciência, vou espanando a poeira. Aproveitei para responder aí embaixo ao pessoal que deixou comentários lá no último texto sobre Londres. Vejam só, além de me mimar com sua presença, amigos, vocês ainda me servem de pauta. Obrigadinho.

Resposta à Gi

A mui nobre senhorita quelquechose me alertou para o Curitiba Pop-Rock Festival. Até que enfim, Gi, no meio do festival de desgraceiras que tem sido o noticiário das últimas semanas, alguma coisa surge para afagar essa alma sofrida. O Weezer na Pedreira Leminski tem tudo para ser digno de boas lembranças. Méritos à produção do CRF, que conseguiu manter o nível e continuar sua antologia indie neste ano. Depois dos Pixies ano passado e Weezer em setembro próximo, o que o povo do All Star preto pode esperar para o ano que vem?

Mas confesso que meu coração está abalado mesmo é com o Wilco em novembro. Se não confirmarem nada para São Paulo, novamente terei o prazer de visitar o MAM na cidade maravilhosa. Por mais que o bolso doa, algo em mim torce para que eu seja mesmo obrigado a ir ao Rio novamente. Só fico com medo do TIM Lab ser pequeno demais para os fiéis de Jeff Tweedy espalhados pelo país.

E ainda tem Strokes, não dá para esquecer.


Resposta ao Rodrigo e ao Digones

Meus caros, esse texto do Garton Ash traz mesmo uma lucidez bem rara nestes momentos. Sinceramente, não tenho muito mais a dizer sobre os atentados – minha opinião está bem próxima do que ele disse ali.

Infelizmente, acredito que as novas explosões desta semana, por mais que não tenham deixado vítimas, tornaram as perspectivas um pouco mais sinistras. Afinal, não é pelo fato dos atentados estarem seguidamente fazendo menos mortos que eles tenham se tornado menos eficientes. Uma constância de pequenos atentados, mesmo sem vítimas, pode ser muito mais danoso à psicologia de uma população que um grande evento trágico isolado. Ainda tanto pior se esses pequenos sustos ocorrerem exatamente na seqüência do tal grande evento trágico. Condicionamento psicológico à favor do terror, quebrando até mesmo o louvável estoicismo britânico, vide o fortuito assassinato do emigrante brasileiro. Manter a sobriedade passa a ser difícil até para os ingleses.


Resposta ao Ludovico

Engraçado você falar no Wodehouse, Ludovico. Acabei de ler, há poucos dias, duas estórias curtas dele, “The Impending Doom” e “Song of the Songs”. Foram minhas primeiras, e me deram vontade de ler muito mais. Biscoito fino, Jeeves rules.

Aliás, falando em pocket-books, me permita uma estorinha. Por conta do meu curso de Espanhol, tenho ido à Av. Paulista pelo menos duas vezes por semana. Procuro sempre usar o metrô porque, afinal, estacionamento por ali é coisa ultra-valorizada. Acontece que o tempo às vezes aperta e me obriga a ir de carro mesmo. Para essas ocasiões, consegui arranjar um esquema interessante: deixo comodamente o carro no Conjunto Nacional e, depois da aula, compro um pocket-book dos mais baratos na Livraria Cultura. Acabo pagando uns 8 reais no livro e ganho o direito de só pagar mais 3 pelo estacionamento. Deixar o carro, em qualquer outro lugar, não sairia por menos de 8 reais. Sim, claro, no final das contas gastei onze ao invés de oito. Mas levo o livrinho para casa, oras.

Tão gostosa é a sensação questionável de comprar um pocket por 3 reais, que preciso me segurar para não começar a abandonar o metrô de propósito. Minha casa se encheria de livrinhos, mas aos poucos minha carteira ficaria bem mais leve. Ao final, uma dica: os pocket-books da Penguim, mesmo importados, conseguem ser mais baratos que os da LP&M e Martin Claret (custam R$ 7,75 enquanto os brasileiros podem custar oito, doze ou até vinte quatro reais). Quando se pensa que o preço de capa da Penguim é de uma libra e meia, vê-se que isso sim é política de incentivo à leitura. Para quem quer treinar o inglês, a opção é excelente.


Reposta à Patty

Patty (Patrícia?), legal você ter gostado do Diário. Volta-e-meia me perguntam por que não escrevi até o fim das andanças até Machu Picchu. Na época creio que foi por preguiça. Hoje não sei se conseguiria recuperar o clima da viagem. Mas enfim, quem sabe ainda tento.

sábado, julho 09, 2005

Londres



Quando as bombas atingiram minha cidade natal, eu estava dormindo na Califórnia. Ao acordar, vi os feridos surgindo daquelas familiares estações de metrô londrinas e os destroços do ônibus da linha 30, tudo mediado pela televisão americana. Um comentarista americano disse: "Isso mostra que vivemos em um mundo em guerra." E todas as fibras do meu corpo responderam: não, essa não é a lição de Londres.

Londres sabe bem com o que se parece uma guerra. Lembra-se da 2a Guerra Mundial em cada detalhe, de uma forma que Nova York não poderia. Apesar de essas explosões terem produzido o maior número de mortes na cidade desde 1945, essa não é uma guerra, como os comentaristas americanos gostam de imaginar. Guerras são vencidas por Exércitos. Exércitos sustentados por sociedades, economias e inteligências fortes, com certeza; mas ainda assim, Exércitos. Isso nunca será uma guerra.

Isso é outra história. (...)

Vai haver mais disso. (...) Em certa medida, teremos que aprender a viver com isso, como vivemos com outras ameaças crônicas. É nisso que Londres mais impressiona. Os chefes de polícia já tinham alertado que a questão não era "se, mas quando" um ataque terrorista aconteceria. (...)

A fleuma, a sobriedade e a determinação com que os londrinos enfrentaram os ataques de quinta-feira refletem uma longa experiência, principalmente de 30 anos de ataques do IRA, assim como o temperamento nacional. Conviver com isso, como fazem os londrinos, é a melhor resposta que as pessoas comuns podem dar aos terroristas. Devo dizer que eles fizeram com que eu tivesse mais orgulho da minha cidade natal do que o sucesso da candidatura de Londres para ser a sede da Olimpíada de 2012, anunciada no dia anterior.

Quanta liberdade estamos dispostos a sacrificar em nome da segurança? Há um perigo real de que países como os Estados Unidos e o Reino Unido se direcionem para um Estado de segurança nacional, com mais perdas de liberdades civis. Isso não poder ser - porque vai custar-nos liberdade sem trazer qualquer garantia de segurança. Eu, por mim, preferiria continuar mais livre, e correria um risco marginalmente maior de ser explodido por uma bomba terrorista.

Isso não significa ser passivo ante essas atrocidades. Mas a resposta adequada não está, como os comentaristas da Fox News americana querem que acreditemos, em maior poderio militar para acabar com "o inimigo" no Iraque ou em qualquer lugar. Está em policiamento adequado e polícia inteligente. Recusando silenciosamente a metáfora da guerra, a Polícia Metropolitana da Londres descreveu os locais dos ataques ao metrô e ao ônibus como "cenas do crime". Isso mesmo. Crimes.

Trabalhando na cidade mais etnicamente diversa do mundo, eles desenvolveram pacientes técnicas de relações comunitárias e reunião de informações, assim como de investigação depois do evento. Isso não vai impedir os ataques. Não impediu esse. Mas policiamento adequado internamente, não o envio de soldados ao exterior, é a forma de reduzir a ameaça de terroristas que operam (...).

Depois, há a política de inteligência. Estava certo tirar a Al Qaeda do Afeganistão pela força das armas. Em contraste, está cada vez mais claro que a invasão do Iraque foi um erro, que quase certamente criou mais terroristas do que eliminou. Mas agora precisamos dar o nosso melhor em um péssimo trabalho. A última coisa que devemos fazer em resposta a esse ataque é sair do Iraque. Ao contrário, agora é hora de todas as democracias se unirem em torno da causa de reconstruir um Iraque pacífico e a meio caminho de ser libertado, enquanto insistem em novas mudanças na política de ocupação por parte dos soberanos Estados Unidos, não mais tomados pela febre conservadora de três anos atrás.

Um acordo de paz entre Israel e palestinos removeria outro grande sargento recrutador de terroristas islâmicos. E, é claro, trabalhar na direção da modernização, liberalização e democratização do Oriente Médio é a única estratégia de longo prazo que certamente vai drenar o pântano no qual os mosquitos terroristas são criados.

Aqui, é a Europa, mais do que os Estados Unidos, que precisa acordar, urgentemente, para o imperativo de fazer mais. Nestes dias, coisas que acontecem longe daqui, em Cartum e Kandahar, têm impacto direto sobre nós - às vezes fatal, enquanto vamos para o trabalho sentados num trem de metrô entre King's Cross e Russel Square. Não existe mais essa coisa de política externa. Essa é, talvez, a mais profunda das lições de Londres.


Timothy Garton Ash, historiador britânico e diretor do Centro de Estudos Europeus.