sexta-feira, abril 13, 2007

Listas

Virou algo como um símbolo do nosso tempo essa obsessão por elaborar listas. Esses tais “20 melhores filmes da década”, “10 homens mais sexy do mundo”, ou mesmo “os 5 melhores cantores de folk-music dos anos 60”, parecem estar estampados em todo lugar. Ao lado do i-Pod, da internet e do Big Brother, essa mania de categorizar, sistematizar e catalogar referências culturais também é um sintoma bem interessante do espírito desta nossa era.

Digo interessante porque, ironicamente, não há nada mais irracional que tentar impor esse grau de racionalidade a coisas completamente subjetivas. É, portanto, bastante estúpido dar qualquer credibilidade a 99,99% dessas listas, na sua grande maioria baseada em enquetes de abrangência minúscula, com nível zero de rigor conceitual ou qualquer análise mais apurada, quando não raro simplesmente construídas deliberadamente através do gosto pessoalíssimo de dois ou três redatores descolados.

Como já disse, é sintoma de um tempo que prefere o raso e o rápido ao profundo e criterioso, que privilegia o personalismo barato das escolhas subjetivas e depreza a necessidade de uma opinião mais elaborada, fria e distanciada. Ao mesmo tempo, também é sinal de uma necessidade obsessiva de colocar um pouco de ordem no caos, de criar logo um registro mais perene de uma realidade que passa cada vez mais rápido, mesmo que essa fotografia do momento presente seja algo apressada, sem muita qualidade ou critério. Como numa fotografia digital clicada por um telefone celular, o importante não é a nitidez mas apenas capturar o momento.

É cem por cento claro também que estou sendo um grandíssimo chato nesta minha análise. Porque, ao mesmo tempo que são estúpidas, as listas são inegavelmente deliciosas. Deliciosas de fazer, deliciosas de consumir. Um prazer inescapável, é simplesmente dificílissimo fugir do fenômeno – o que demonstra que essa obsessão é de verdade um belo sintoma da psique algo demente desta nossa geração.

Como às vezes sou quadradinho ao exagero, meu cérebro precisa desmontar algumas armadilhas antes de conseguir apreciar as tais listas. Para mim, por exemplo, elas só funcionam se forem feitas e vistas como algo que pretenda refletir exclusivamente um gosto pessoal. Listas absolutas, que se pretendem "a tábua da lei", não me convencem. A última vez que senti essa dificuldade foi quando o Marcelo Costa, do Scream&Yell, me chamou para votar nos Melhores do Ano a serem eleitos pelo site. Me senti honrado pelo convite, é claro, mas também bastante angustiado. Dúvidas, idiotas eu sei, me atormentavam. Como escolher os “cinco melhores discos lançados em 2006” se eu devo ter escutado apenas uma dúzia de álbuns novos durante o ano? Como votar na “melhor música do ano” se eu devo ter escutado, otimisticamente, não mais que 0,001% das músicas lançadas em 2006? Eu me sinto tranquilo em escolher, é claro, os cinco melhores álbuns que eu escutei em 2006. Isso eu consigo. Posso também eleger aquela que, após ser devidamente filtrada pelos meus gostos, costumes e preferências, formados biológica e historicamente, se transformou na melhor música a chegar aos meus ouvidos no ano que passou.

É por isso que, no caso dessa pesquisa do Scream&Yell, sempre achei muito mais interessante consultar os votos individuais de cada “eleitor” convidado (que o Marcelo gentilmente disponibiliza) do que saber dos resultados finais de cada categoria. Enquanto o resultado consolidado me parece algo vago, as listas individuais me trazem um pouco da fotografia de cada pessoa, refletindo não apenas seus gostos e preferências culturais mas também revelando um pouquinho do perfil de cada um, da sua história e das inevitáveis influências das suas origens, do seu meio, da sua atividade.

Por mais incontáveis ranqueamentos que a Bizz, a MTV e a E!Television divulguem, e por mais fascinantes que eles sejam pela sua vã tentativa de colocar ordem na bagunça, essas listas serão sempre algo disformes, forçadas e incompletas. As melhores listas, as mais gostosas de se ler ou fazer, são sempre as listas particulares.

E é claro que toda essa gastação de verbo anterior foi simplesmente uma tentativa de me justificar. Sim, me entregarei a mais esta chaga dos tempos pós-modernos. Nas próximas semanas uma sequência de listas povoará e dará alguma vida a este minguado bloguinho. Lembrando sempre que as listas não refletirão a Verdade, apenas minhas preferências pessoais.

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