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sexta-feira, março 07, 2003
Momento Supercine de Cinema
Vamos lá, sem mais delongas. Como diria aquele comentarista esportivo esquizofrênico, no pique, um, dois, três filmaços na corrida pelos Óscares...
Prenda-me Se For Capaz
Permitam-me a bicheza: esse filme é uma delícia. Como já disseram por aí, vá assistir agora. E, por favor, me convide que eu quero ver de novo. Vá e assista sem culpa. Sem culpa de se divertir, de se emocionar com os truques manjados de Spielberg, de torcer para o malandrinho se dar bem, de querer ter a mesma lábia, a mesma vida fácil e cheia de aventuras daquele fantástico salafrário.
Spielberg, de novo, faz seu conto de fadas. Um pouco mais maduro, com uma pitada a mais de sofrimentos e decepções, mas ainda assim um conto de fadas. Consegue equilibrar com maestria o moralismo da responsabilidade por nossos atos com o charme da estória do bom-ladrão, com todos os temperos que o ato de sair um pouco (ou muito, nesse caso) da linha pode dar à vida.
Mas esse psicologismo é o que menos importa. O filme é ágil, leve e divertido, Leonardo di Caprio está surpreendentemente melhor e mais versátil que em Gangues de Nova York e Christopher Walken tem uma atuação primorosa, candidato forte à estatueta de coadjuvante. Tudo isso, entretanto, tornou-se desnecessário, pois eu já estava devidamente conquistado apenas pela ambientação e pelo visual 60s, pela seleção de músicas escolhidas a dedo (de Sinatra à The Kinks), e por aquela abertura com grafias a la Pantera Cor de Rosa, sob a trilha do Henri Mancini. Foi mesmo covardia.
Consuma sem medo de ser feliz.
Adaptação
Filme da dupla dinâmica Spike Jonze (direção) e Charlie Kaufman (roteiro), os mesmos do nosense e brilhante "Quero ser John Malkovitch". Na verdade, o próprio filme já te explica isso direitinho: Adaptação narra a estória do seu próprio roteirista, Charlie Kaufman, que, durante as filmagens de seu primeiro e célebre roteiro, o citado "Quero ser John Malkovich", se vê cheio de dúvidas existenciais geradas pelas cobranças por escrever um novo roteiro brilhante.
Terá Charlie Kaufman sucesso em derrotar todas suas neuras de Woody Allen e dar a luz à mais uma pérola do cinema? A resposta nada mais é que o próprio filme, pois é o próprio roteiro de Adaptação que Kaufman luta para escrever durante o filme. Complicou? É complicado mesmo. Como o próprio Kaufman percebe angustiado em certo momento, o roteiro que começa a tomar forma em suas mãos é completamente "elíptico, solipsista, auto-referente. Esquizofrênico, portanto". Bendita loucura.
Para complicar ainda um pouco mais, Kaufman convive com seu irmão-gemêo, um pretenso aprendiz de roteirista, cheio de clichês e de boa vontade. Na verdade um alter-ego do próprio, sua contradição que acaba tornando-se sua salvação. E aí está uma das coisas mais hilárias do filme. As discussões entre os dois, cheias de referências e insights geniais, é o que dá brilho à estória. E Nicholas Cage em dose dupla, uma idéia que para mim chegava a me embrulhar o estômago, dá conta do recado e muito mais. Meryl Streep e Chris Cooper têm atuações convicentes, mas acredito que não são dignas de premiação.
Abusando do clichê, Adaptação é mais um sopro de inovação e criatividade que a dupla Jonze & Kaufman dá ao cinema americano. Não achei tão empolgante quanto a saga ao interior do cérebro de John Malkovich, mas é ainda uma idéia genial. No final do filme, no entanto, a idéia genial sai um pouco do trilho e a virada na estória (que também vem de uma sacada genial) acaba se mostrando um pouco infeliz. O conjunto, no entanto, se salva com muitos méritos.
As Horas
Contrariamente ao que eu esperava, a conturbada estória da escritora inglesa Virgínia Woolf não é a trama central de As Horas. Funciona, digamos assim, como um fio condutor temático que permeia a narração de um dia na vida de outras duas mulheres: Julianne Moore, uma dona de casa dos anos 50 e Meryl Streep, outra "dona de casa", só que em 2001. Mesmo não possuindo a estória central, Virgínia Woolf é o personagem mais fascinante e complexo, reponsável por toda a densidade do filme. E Nicole Kidman segura a barra das crises existencias da escritora com unhas e dentes, um nariz enorme e um sorriso maravilhosamente enigmático. Dá show de bola. Consegue estar, ainda que com o nariz ressaltado, extremamente bela.
Pela narrativa de várias estórias entremeadas e pela complexidade dramática dos personagens, em certo momento As Horas me lembrou um pouco Magnólia, de Paul Thomas Anderson. Com certeza, devo ter sido levado pela presença da angustiada Julianne Moore e do discreto John C. Reilly, dois atores tradicionalmente "Andersonianos". Mas as qualidades dos filmes também se assemelham. As Horas, se não tem a inventividade de Magnólia, possui a mesma sinceridade e intensidade de sentimentos.
Nesse ponto, é possível que a mão do diretor Stephen Daldry tenha tido papel fundamental. Proveniente do teatro inglês, Daldry já mostrou que é excelente diretor de atores no seu filme anterior, o ótimo "Billy Elliot". Desta vez sua trupe fez por merecer e não se estranharia se Nicole Kidmam finalmente abocanhasse sua estatueta, assim como se a ruiva Moore e também Ed Harris emplacassem uma dobradinha na premiação para coadjuvantes. Ainda para ser lembrado: a trilha incidental de Phillip Glass é linda e também merecedora de premiação.
As Horas não é nunca convencional, mas é bastante tradicional no seu conteúdo. Adequado aos gostos da Academia, portanto. Sem demérito nenhum nisso, pois é um filme fantástico, com atuações primorosas, e baseado numa estória fascinante. Como acredito que nem Gangues, nem o Pianista, nem o Senhor dos Anéis levam o prêmio de melhor filme de 2002, a disputa fica entre ele e Chicago.
Chicago vai ter que ser mesmo um filmão para derrubar As Horas. O que não levo muita fé.
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Adaptation
The Hours
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