quinta-feira, março 27, 2003



Momento Supercine de Cinema



O Americano Tranquilo

Manter baixas as expectativas talvez seja o segredo da felicidade na vida. Fui assistir a "O Americano Tranquilo" com o menor dos comprometimentos. Na verdade, havia ido ao Frei Caneca Shopping Mall Cool Culture Center para ver O Pianista, mas a multidão em polvorosa já havia esgotado os ingressos. O filme que deu a indicação ao Oscar de melhor ator a Michael Caine foi, portanto, um acaso no meu domingo.

Sorte minha, pois o filme é ótimo. Havia lido algumas críticas alegando que Caine era a única coisa que o fazia valer a pena. Mentira. O filme é competentíssimo, muito bonito visualmente, com uma trama envolvente e bem contada. A atuação de Caine é mesmo excelente, mas os outros atores também dão conta do recado.

A estória é um capítulo a parte. E para quem gosta de História (agora com H) é um prato cheio. Michael Caine interpreta um jornalista inglês em cobertura à guerra da Indochina, a luta de libertação do Vietnam frente aos colonizadores franceses. Isso em 1954, e Caine já está no Vietnam há um par de anos. Entre reportagens enviadas ao London Morning e pitadas de ópio nas horas vagas, ele consegue construir uma relação amorosa duradoura com uma garota vietnamita. Eis que, a certa altura, chega ao local o tal americano tranquilo, Brandon Fraser, um médico em campanha humanitária. O médico se envolve com o casal e, rapidamente, passa a cortejar a garota do jornalista inglês.

Todo o contexto da guerra e o início do envolvimento americano no conflito são retratados de forma muito clara e interessante. Sem cabecismos, mas também sem simplificações que deixariam de lado as nuances e os objetivos nada transparentes dos envolvidos. Conforme a trama se desembaraça, pouco a pouco vai ficando claro o interessante paralelo criado entre o conflito do trio de personagens principais (o tradicional europeu, a atraente vietnamita, e o americano tranquilo mas intrometido) e os papéis dos países envolvidos na guerra propriamente dita (França, Vietnam e EUA). O mérito aqui, na verdade, não é propriamente do filme, mas sim do livro no qual ele foi baseado, obra do escritor inglês Graham Greene. Católico e humanista, Greene, que teve também seu "Fim de Caso" adaptado para a telona, demonstra uma visão ácida tanto sobre o velho colonialismo europeu como sobre o novo imperialismo americano.

Este sim é um filme corajoso em tempos de Doutrina Buxiana. Muito mais corajoso que o "Gangues de NY", de Scorscese. Porque em "O Americano Tranquilo" o paralelo está claríssimo, jogado na cara do público. O americano, inicialmente cheio de boas intenções, mais tarde não hesita em utilizar quaisquer meios para atingir seus fins. Qualquer semelhança com o tempo presente, ali não é mera coincidência, mas sim o curso da história repetindo seus padrões.

Mais surpreendente ainda é que, assim como o "Gangues", o filme também não se trata de um lance oportunista em decorrência da longo processo que resultou na Guerra do Iraque. Ele também já tinha seu lançamento previsto para o final de 2001, mas foi adiado em virtude do espírito patriótico exigido no pós-11 de setembro. Na verdade, dizem que o filme só foi mesmo lançado em 2002 por muita insistência de Michael Cane, que apostava no gabarito de sua atuação. Apostou certo, não só na sua atuação, mas em um filme competente e completamente adequado ao momento presente.

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Site Oficial

quarta-feira, março 26, 2003



Vigiando os astros distraído

Dêem uma olhada com meu horóscopo de hoje:

Escolha conscientemente as impressões que você deseja receber do mundo e das pessoas. Você é sensível, mas não precisa ser sensível a tudo e a todos, você pode sintonizar-se com a melhor onda que acontecer por aí.(by Quiroga)

Agora, leiam o finalzinho do meu último post, logo aí embaixo... Tudo a ver, não é?

Tá bom, eu também sei que nestes tempos conturbados, esse conselho do Quiroga na verdade pode se adequar a todo mundo. Não deixa de ser uma coincidência interessante, porém.

O fato é que, conforme vou conhecendo um pouco mais desse negócio de Astrologia (e conheço pouco, muito pouco), é impressionante como a coisa faz cada vez mais sentido. E confesso que isso gera um baita conflito nesta minha cabecinha mezzo racional, mezzo intuitiva. Como não acredito nada em determinismos, nem racionais e muito menos irracionais, não dou bola para o lado das previsões futurísticas. Mas na descrição de estilos de personalidade, e o processo de auto-conhecimento que se pode tirar dali, a Astrologia possui uma coerência surpreendente.

E não me perguntem os porquês. Os céticos que me perdoem, mas a lógica cartesiana não explica tudo no mundo. Existe muito mais entre o céu e a terra, e que hay brujas, ah, las hay.

terça-feira, março 25, 2003



Blog Zapping

Navegando pelos blogues da vida, encontro algumas coisinhas que me dão uma vontade danada de colocar por aqui. E algumas vezes não dá para resistir...

***

French Fries are from Belgium anyway.
(Stuart Braithwaite, notando que os norte-americanos, além de francófilos, são burros)

Chupinhado do blog do Daniel Galera...

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"Whoa. On behalf of our producers Kathleen Glynn and Michael Donovan from Canada, I'd like to thank the Academy for this. I have invited my fellow documentary nominees on the stage with us, and we would like to — they're here in solidarity with me because we like nonfiction. We like nonfiction and we live in fictitious times. We live in the time where we have fictitious election results that elects a fictitious president. We live in a time where we have a man sending us to war for fictitious reasons. Whether it's the fictition of duct tape or fictition of orange alerts we are against this war, Mr. Bush. Shame on you, Mr. Bush, shame on you. And any time you got the Pope and the Dixie Chicks against you, your time is up. Thank you very much."

Discurso do Michael Mooore no Oscar, chupinhado do blog do Amarar...

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Blog dos correspondentes da BBC no Iraque.

Chupinhado do 168horas, do Freddy Blynk.

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Eu sei que tudo aí em cima é em inglês, mas vale a pena fazer uma forcinha. Este blog da BBC é ótimo, assim como o restante da cobertura do site. Ontem vi o Marcelo Resende, do Cidade Alerta, no programa da Luciana Gimenez falando sobre a guerra. Não sabia se ria ou chorava. Como comentou o próprio Freddy, depender da TV aberta para informar-se é dose.

No meio de tanta informação, muitas vezes explorada de maneira irresponsável, para não fritar a cuca é preciso selecionar as fontes. Por isso, recuse os atravessadores e os aproveitadores de plantão e vá direto às fontes confiáveis. Costuma valer a pena.

segunda-feira, março 24, 2003



OSCAR
ou The Show Must Go On?

Foram dois os comentários mais ouvidos a respeito do Oscar nestes dias pré-premiação. O primeiro, um comentário velho e que se ouve todo ano: o prêmio é um embuste, sem critérios qualitativos, manipulado pelos lobbies dos estúdios, um tal de Troféu Imprensa americanista. O segundo, talvez para dar novo fôlego ao já desgastado primeiro comentário, mostrava-se antenado ao momento presentíssimo: nada poderia ser tão fútil e ridículo que uma festa de gala em meio a um tempo de guerra.

Tenho que me confessar colonizado então. Ontem fiquei acordado até as duas horas da madrugado acompanhando a entrega dos prêmios. E, pior, ainda achei a festa curta, o que denuncia um histórico de acompanhamento das festas anteriores.

O mais engraçado é que, ao se tratar do Oscar, é sempre assim: todo mundo comenta, mas sempre faz um adendo anterior a respeito da inutilidade e da futilidade da coisa. E lá vamos nós ouvir os tais dois comentários citados que, no fundo da minha opinião, não passam de tremenda besteira. Porque acho besta querer exigir justiça, pregar um “padrão de qualidade” que às vezes reflete nosso gosto pessoal. O Oscar é uma premiação americana sim, e por isso suscetível a apelos monetários e conservadores. Nem por isso deixa de ser interessante para quem gosta de cinema. E falar que o reconhecimento do prêmio não vale nada, é ser muito franciscano e desapegado mesmo. Nem Caetano teve a alma tão elevada assim para recusar-se a comparecer. A segunda besteira, o papo que fazer festa em tempos de conflito é ridículo, nada mais é que assumir a neurose da doutrina bushiana e pregar que paremos tudo então e caminhemos todos ao front. Algo como cancelar todos os investimentos em cultura e educação para encaminhar as verbas ao Fome Zero. Alho e bugalhos, cada um no seu saco.

Bem, agora que já justifiquei minha alienação e expiei minha culpa, vamos à festa.

Para justificar a festa, monte-se o palanque

A festa, previsivelmente, não teve a mesma pompa que em outros anos. Os números musicais, a apresentação dos concorrentes, as coreografias, as homenagens, tudo foi espartanamente mais objetivo. Ficou mesmo melhor, talvez tenham achado o ritmo adequado a uma cerimônia sempre longuíssima.

Da mesma forma, como também como já se esperava, o dilema festa versus guerra foi combatido com o palco de demonstrações pacifistas em que se transformou o Kodak Theatre. Se foram adequadas ou não, talvez isso dependa do seu próprio posicionamento perante o assunto. Houve de tudo, desde protestos emocionados mas concisos, como a paz pedida por Chris Cooper (melhor coadjuvante por Adaptação), até o esperado discurso sem papas na língua de Michael Moore (melhor documentário, inegável, por Bowling for Columbine). Detalhe que o discurso de Moore, pelo caráter político e não só pacifista, provocou até mesmo algumas vaias dos até ali cândidos membros da Academia. Mas ainda houve mais, o Paz & Amor discreto e charmoso dos dedinhos de Susan Sarandon, as pombas da paz na lapela de quase todos, as palavras finais de Adrien Brody (surpreendentemente o melhor ator por O Pianista) que, quase cortado pela pressa do cerimonial e do Rubens Edwald Filho, ainda conseguiram expressar a sinceridade e a emoção mais bonitas da noite.

A vitrine pacifista não surpreendeu ninguém. Ninguém mesmo iria perder a chance de ter palco e microfone para o mundo, quer fosse para expressar sua opinião engajado ou para expiar a culpa de vestir smoking e não farda. O que ninguém esperava é que a Academia fosse também derrubar a imagem de embuste e manipulação e que realizasse a premiação mais inesperadamente coerente dos últimos anos. Lógico, não foi assim, tudo isso, mas foi quase.

Surpresas, quase até o final

Fique claro primeiro que errei todas as minhas previsões (confira a lista de vencedores aqui). Menos uma: Nicole Kidman era o único caso em que minha preferência pessoal combinava com as probabilidades, e não deu outra. De resto, fui um fracasso premonitório. Mas, na maioria das vezes, me surpreendi para melhor.

A escolha de Chris Cooper, melhor coadjuvante pelo esquisito Adaptação, deu o tom das surpresas que estavam por vir. Frida levando dois prêmios, ainda que técnicos, e Almodóvar vingando seu Fale com Ela com o Oscar de melhor roteiro original. Discursos de “viva-México” e a presença transparente de Jennifer Lopez. O jovem e audacioso cucaracha Gael García Bernal (de E Tua Mãe Também), após dar uma bela espetada em Bush, apresentando o número musical de Caetano cheio de elogios ao baiano, e este fazendo bonito no palco. Tudo estava latinamente diferente, não-convencional.

A surpresa maior, como é de praxe, ficou para o final. E, claro, chamou-se O Pianista. O filme levou, merecidamente mas de maneira totalmente inesperada, uma trinca de prêmios de extremo respeito (melhor roteiro adaptado, melhor ator e melhor diretor), o que só não se refletiu no Oscar de melhor filme porque, bem, afinal o mundo ainda não é perfeito, ainda há guerras, loobies econômicos e diversão gratuita.

Chicago ganhou um Oscar de melhor filme sustentado apenas pelos prêmios técnicos e pela barriga da Catherine Zeta Jones. Vitória dos velhos padrões da Academia, claro, mas um tanto oca e esquisita. De resto, demais prêmios de peso foram justamente distribuídos. Apesar das opiniões em contrário, gostei de Gangues de Nova York, e Martin Scorscese talvez tenha sido de novo o maior injustiçado da noite. O mesmo vale para Daniel Day Lewis. Mas perder para “O Pianista” foi perder com honra.

Foi isso. Uma premiação que arriscou-se coerente e inovadora, mas que, no final, não pôde resistir à escolha mais conveniente. De resto, todas as deliciosas futilidades, as gafes, o sorriso de Jack Nicholson, o sotaque carioca de Sean Connery, a presença dos vovôs Peter O`Toole e Olivia de Havilland, as piadas deslocadas e os figurinos infelizes que fazem a graça de qualquer festa.

E eu gosto de circo também, fazer o quê.

terça-feira, março 18, 2003



Ela, de novo





Peço imensas desculpas a mim mesmo. Somente assisti a "Moulin Rouge" hoje. Fantástico.

Peço também desculpas à Gwyneth Paltrow, mas ela acabou de perder o posto de minha loira favorita.

Com todo respeito ao Chicago, não há nem comparação.

E, antes que eu me esqueça, com todo respeito, quer dizer, sem respeito nenhum mesmo: Tom Cruise, definitivamente você é um babaca.



Trip

"É possível ter carinho pela pessoa com quem a gente transa e transar com quem sentimos carinho. Mas em uma alternância. O sexo não é o momento do carinho. Quando as relações se tornam totalmente carinhosas, e as pessoas começam a falar como bebês, daqui a pouco somos como a Mickey e a Minnie e vamos dormir com o pijaminha da Disney. Pode ser legal, mas aí a gente vai acabar não transando mais. Por isso que um bom casal é um casal que briga."

"Você pode escolher entre ficar em casa ou pegar a estrada e, sem dúvida, faz e fará um pouco dos dois. Mas, quando estiver em casa, tente não sonhar com a estrada e, quando estiver na estrada, tente não lamentar o calor do lar. Vivemos de sonhos e de nostalgias: é necessário cuidar para que essa alternância não nos mantenha constantemente afastados do momento presente."

Cheia de incoerências e opiniões auto-referentes. Simplesmente excelente a entrevista com o psicanalista Contardo Calligaris na Trip deste mês.

E vale a pena comprar a revista, que está muito mais bonita e legível com o novo formato e diagramação.



Enquanto isso, numa ilha inóspita no meio do Atlântico...

O que se pôde ver no último domingo na entrevista coletiva concedida por Pink e Cérebro, digo, Bush e Blair, é que, para surpresa de todos, sim, vai haver a invasão do Iraque, caros amigos.

No entanto, houve uma uma mudança sensível no discurso dos "Aliados". Como até a Veja percebeu, capitulando na última edição, os publicitários saxões perceberam que a linha de comunicação estava equivocada e resolveram mudar de tom. Não se ouviu mais nada parecido com a "necessidade de combater o famigerado Eixo do Mal". No lugar disso, algo como "conforme previsto pela Resolução 4041, chegou o momento da comunidade internacional reagir à perigosa indolência de Sadam às determinações da ONU".

Tony Blair é inegavelmente um líder de respeito. Equivocado ou não, seu discurso transmite coerência, credibilidade e, até mesmo, sinceridade. Parece confortável com essa nova estratégia de justificativas para o ataque. Não deixou de citar, inclusive, que existe forte preocupação em minimizar os danos ao povo do Iraque e que, uma vez acabada a guerra, a posse do petróleo continuará nas mãos do povo iraquiano.

Por outro lado, Tio Bush continua irradiando prepotência. Na entrevista, estava um tanto travado, talvez limitado em seu vocabulário pela exigida mudança de tom no discurso. Mas seu ar continua arrogante, como se deixasse sempre claro nas entrelinhas que "estamos fazendo um favor de pedir autorização para vocês, seu vermes inoportunos".

Como já disse Colin Powell, o tempo da diplomacia acabou. Isso é certo. Mas esse estica e puxa de justificativas ainda deve continuar por muito tempo. Afinal, as passeatas só devem aumentar e a imprensa vai ficar cada vez mais faminta por explicações. No final, nada mais que retórica, com muito pouco efeito depois que as cortinas se abrirem.

E, apesar do equilíbrio de Tony Blair, resta agora apenas saber o que os "Aliados" realmente farão com o que restar da Mesopotâmia.


quarta-feira, março 12, 2003



O bobo da corte

Esse César Giobbi, sempre aprontando das suas. Quando não me mata de vergonha, me mata de dar risada. Dê uma olhada na nota que saiu ontem sua coluna do Caderno 2 do Estadão:

Encontro discreto

No sábado, pouco antes de embarcar para o Brasil, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso foi almoçar com o presidente francês, Jacques Chirac. Portanto, não surpreende a notícia de que Chirac queira ir ao Conselho de Segurança para votar contra o ataque dos Estados Unidos ao Irã.

FHC, um democrata, pacifista, que tanto quis que o Brasil entrasse para esse Conselho, deve ter dado a maior força.


Não é uma graça esse menino? É de uma inocência que chega a ser risível. Com todo o respeito ao mui nobre gajo Éfe Ága, menos, muito menos...

Parafraseando um antigo filósofo, ninguém mesmo é colunista social impunemente.



Opiniões diferentes

Bem, falo sempre por aqui sobre a importância do debate, que o dissenso é fundamental, blá, blá, blá... Vamos então colocar esse papo em prática e dar voz às opiniões diversas.

O Estadão publicou ontem um excelente texto do economista americano Thomas L. Friedman, defendendo a intervenção militar no Iraque, mas divergindo completamente das estratégias utilizadas até agora por Bush. A posição de Friedman (pela guerra, mas contra Bush) chega a ser um alívio ao maniqueísmo religioso que a discussão se tornou. Há muito mais que dois lados nesta questão.

É uma análise bastante americanista, sem dúvida, mas extremamente racional, livre dos messianismos religiosos e da papagaiada publicitária da luta contra o "Eixo do Mal". No texto, Friedman chega a chamar Chirac de cínico e, nas entrelinhas, deixa sua mensagem para Bush: deixe de ser cínico você também.

Uma palhinha, mas vale ler na íntegra:

Essa não é uma guerra necessária. Aquela era, a do Afeganistão. A do Iraque é uma guerra de escolha - uma legítima escolha para preservar a credibilidade das Nações Unidas, que Saddam desafiou por 12 anos, e para destruir sua tirania e substituí-la por um regime decente, que possa conduzir uma reforma no mundo árabe muçulmano. Essa é a verdade.

O problema que Bush está tendo com os legítimos críticos dessa guerra tem raiz no consistente exagero deste ponto. Quando Bush pega uma guerra de escolha e a converte em uma guerra de necessidade, as pessoas naturalmente perguntam: "Ei, o que está acontecendo aqui? Nós estamos sendo enganados. A verdadeira razão deve ser seu pai, o petróleo ou alguma ideologia de direita."


terça-feira, março 11, 2003



And my Oscar goes to...





If I were thinking clearly, Leonard, I would tell you that I wrestle alone in the dark, in the deep dark, and that only I can know. Only I can understand my condition. You live with the threat, you tell me you live with the threat of my extinction. Leonard, I live with it too.

Leonard, you cannot find peace by avoiding life.

segunda-feira, março 10, 2003



Procê, linda...

Casa Pré-Fabricada

Abre os teus armários
eu estou a te esperar,
para ver deitar os sol
sobre os teus braços
castos.

Cobre a culpa vã,
até amanhã eu vou ficar
e fazer do teu sorriso
um abrigo.

Canta que é no canto
que eu vou chegar.
Canta o teu encanto
que é pra me encantar.
Canta para mim,
qualquer coisa assim sobre você,
que explique a minha paz,
tristeza nunca
mais.

Vale o meu pranto
que esse canto em solidão,
nesta espera o mundo gira
em linhas tortas.

Abre essa janela,
a primavera quer entrar
pra fazer da nossa voz uma só nota.

Canto que é de canto
que eu vou chegar.
Canto e toco um tanto
que é pra te encantar.
Canto para mim
qualquer coisa assim sobre você,
que explique a minha paz,
tristeza nunca mais.

(Marcelo Camelo, Los Hermanos)

sexta-feira, março 07, 2003



Momento Supercine de Cinema

Vamos lá, sem mais delongas. Como diria aquele comentarista esportivo esquizofrênico, no pique, um, dois, três filmaços na corrida pelos Óscares...





Prenda-me Se For Capaz

Permitam-me a bicheza: esse filme é uma delícia. Como já disseram por aí, vá assistir agora. E, por favor, me convide que eu quero ver de novo. Vá e assista sem culpa. Sem culpa de se divertir, de se emocionar com os truques manjados de Spielberg, de torcer para o malandrinho se dar bem, de querer ter a mesma lábia, a mesma vida fácil e cheia de aventuras daquele fantástico salafrário.

Spielberg, de novo, faz seu conto de fadas. Um pouco mais maduro, com uma pitada a mais de sofrimentos e decepções, mas ainda assim um conto de fadas. Consegue equilibrar com maestria o moralismo da responsabilidade por nossos atos com o charme da estória do bom-ladrão, com todos os temperos que o ato de sair um pouco (ou muito, nesse caso) da linha pode dar à vida.

Mas esse psicologismo é o que menos importa. O filme é ágil, leve e divertido, Leonardo di Caprio está surpreendentemente melhor e mais versátil que em Gangues de Nova York e Christopher Walken tem uma atuação primorosa, candidato forte à estatueta de coadjuvante. Tudo isso, entretanto, tornou-se desnecessário, pois eu já estava devidamente conquistado apenas pela ambientação e pelo visual 60s, pela seleção de músicas escolhidas a dedo (de Sinatra à The Kinks), e por aquela abertura com grafias a la Pantera Cor de Rosa, sob a trilha do Henri Mancini. Foi mesmo covardia.

Consuma sem medo de ser feliz.





Adaptação

Filme da dupla dinâmica Spike Jonze (direção) e Charlie Kaufman (roteiro), os mesmos do nosense e brilhante "Quero ser John Malkovitch". Na verdade, o próprio filme já te explica isso direitinho: Adaptação narra a estória do seu próprio roteirista, Charlie Kaufman, que, durante as filmagens de seu primeiro e célebre roteiro, o citado "Quero ser John Malkovich", se vê cheio de dúvidas existenciais geradas pelas cobranças por escrever um novo roteiro brilhante.

Terá Charlie Kaufman sucesso em derrotar todas suas neuras de Woody Allen e dar a luz à mais uma pérola do cinema? A resposta nada mais é que o próprio filme, pois é o próprio roteiro de Adaptação que Kaufman luta para escrever durante o filme. Complicou? É complicado mesmo. Como o próprio Kaufman percebe angustiado em certo momento, o roteiro que começa a tomar forma em suas mãos é completamente "elíptico, solipsista, auto-referente. Esquizofrênico, portanto". Bendita loucura.

Para complicar ainda um pouco mais, Kaufman convive com seu irmão-gemêo, um pretenso aprendiz de roteirista, cheio de clichês e de boa vontade. Na verdade um alter-ego do próprio, sua contradição que acaba tornando-se sua salvação. E aí está uma das coisas mais hilárias do filme. As discussões entre os dois, cheias de referências e insights geniais, é o que dá brilho à estória. E Nicholas Cage em dose dupla, uma idéia que para mim chegava a me embrulhar o estômago, dá conta do recado e muito mais. Meryl Streep e Chris Cooper têm atuações convicentes, mas acredito que não são dignas de premiação.

Abusando do clichê, Adaptação é mais um sopro de inovação e criatividade que a dupla Jonze & Kaufman dá ao cinema americano. Não achei tão empolgante quanto a saga ao interior do cérebro de John Malkovich, mas é ainda uma idéia genial. No final do filme, no entanto, a idéia genial sai um pouco do trilho e a virada na estória (que também vem de uma sacada genial) acaba se mostrando um pouco infeliz. O conjunto, no entanto, se salva com muitos méritos.





As Horas

Contrariamente ao que eu esperava, a conturbada estória da escritora inglesa Virgínia Woolf não é a trama central de As Horas. Funciona, digamos assim, como um fio condutor temático que permeia a narração de um dia na vida de outras duas mulheres: Julianne Moore, uma dona de casa dos anos 50 e Meryl Streep, outra "dona de casa", só que em 2001. Mesmo não possuindo a estória central, Virgínia Woolf é o personagem mais fascinante e complexo, reponsável por toda a densidade do filme. E Nicole Kidman segura a barra das crises existencias da escritora com unhas e dentes, um nariz enorme e um sorriso maravilhosamente enigmático. Dá show de bola. Consegue estar, ainda que com o nariz ressaltado, extremamente bela.

Pela narrativa de várias estórias entremeadas e pela complexidade dramática dos personagens, em certo momento As Horas me lembrou um pouco Magnólia, de Paul Thomas Anderson. Com certeza, devo ter sido levado pela presença da angustiada Julianne Moore e do discreto John C. Reilly, dois atores tradicionalmente "Andersonianos". Mas as qualidades dos filmes também se assemelham. As Horas, se não tem a inventividade de Magnólia, possui a mesma sinceridade e intensidade de sentimentos.

Nesse ponto, é possível que a mão do diretor Stephen Daldry tenha tido papel fundamental. Proveniente do teatro inglês, Daldry já mostrou que é excelente diretor de atores no seu filme anterior, o ótimo "Billy Elliot". Desta vez sua trupe fez por merecer e não se estranharia se Nicole Kidmam finalmente abocanhasse sua estatueta, assim como se a ruiva Moore e também Ed Harris emplacassem uma dobradinha na premiação para coadjuvantes. Ainda para ser lembrado: a trilha incidental de Phillip Glass é linda e também merecedora de premiação.

As Horas não é nunca convencional, mas é bastante tradicional no seu conteúdo. Adequado aos gostos da Academia, portanto. Sem demérito nenhum nisso, pois é um filme fantástico, com atuações primorosas, e baseado numa estória fascinante. Como acredito que nem Gangues, nem o Pianista, nem o Senhor dos Anéis levam o prêmio de melhor filme de 2002, a disputa fica entre ele e Chicago.

Chicago vai ter que ser mesmo um filmão para derrubar As Horas. O que não levo muita fé.

Sites Oficiais

Catch Me If You Can
Adaptation
The Hours

quinta-feira, março 06, 2003



O absoluto nosso de cada dia

São raras as caminhadas que são feitas sempre em frente, em linha reta, simplesmente para o alto e avante. Qualquer percurso, seja ele a busca do novo emprego ou da paz mundial, é cheio de desvios e obstáculos. É uma idéia bem clichê, digna de qualquer livro de auto-ajuda, eu sei, mas faz cada vez mais sentido na minha cabeça. E antes que você ache que eu andei dando copy-paste no "Minutos de Sabedoria" e desista de ler este post, me deixe chegar ao ponto.

O fato é que não dá para ficar interpretando como veredicto final cada evento que acontece na vida. O paradoxo é que, neste mundo onde tudo muda a cada instante, qualquer coisa explode nas manchetes dos jornais como a Verdade definitiva. Da nova banda salvadora do rock´n´roll à nova posição geopolítica da França, tudo é encarado como extraordinário, impactante, revolucionário. Exceto pelo fato de que, logo no dia seguinte, a verdade definitiva já é outra e precise, para chamar atenção, ser alardeada com o mesmo sensacionalismo. Talvez Paulo Ricardo estivesse mesmo certo e o mundo viva hoje dezenas de revoluções por minuto, mas, até pelo fato de serem tantas, é impossível carregar tanto nas tintas e levá-las tão à sério. Menos, minha gente, menos.

No plano pessoal, parece que acontece a mesma coisa. É tanta a correria que, de repente, quando um piano cai sobre a sua cabeça, parece que o baque é definitivo, que não há mais saída. Aparece qualquer pedra no meio, e já vemos ali o fim do caminho. Melhor desistir, mudar de estação, pular do barco, partir pra outra. Ninguém parece ter mais tempo, ou disposição, para insistir, para tentar duas vezes. Ao mesmo tempo que levamos qualquer obstáculo à sério demais, não hesitamos em procurar outros caminhos mais fáceis. Contráditório, mas nem tanto.

É preciso olhar as coisas com mais perspectiva, acredito. Pausa para respirar, evitar a ansiedade, colocar tudo no devido lugar. E conseguir realmente discernir entre o que é determinante de uma mudança de rumo e o que é simplesmente uma pedra no meio do caminho.

Fluxos e refluxos. A História do mundo, e nossa própria história, estão cheias deles. E às vezes, para se chegar ao mundo melhor ou ao próprio sonho individual, deve-se aceitar aquela velha máxima de dar um passo para trás, para depois dar dois passos para frente.

***

Divaguei, pra variar. Não queria dizer nada sobre escolhas pessoais ou problemas mundiais. Queria apenas falar um pouco sobre algumas coisas que me fizeram refletir sobre as tendências deste nosso mundinho cultural-mediático. Acabou dando nessa papagaiada toda. Mas, vamos lá, são duas as coisas:

Primeiro, acabei topando de novo na rede com os textos do Marcelo Costa, editor do finado Scream&Yell, escrevendo agora no diverso Tsc Tsc Tsc. Marcelo propõe um novo olhar sobre toda essa lenga-lenga de "pra onde vai o meu rock´n´roll"? Um novo caminho para a música pop mundial, um caminho que talvez passe aí pelo seu ladinho...

Do outro lado, a notícia da derrocada da rádio Brasil 2000 FM. Depois de acabar com o programa de rocka alternativo Garagem e perder o desportivo-humorísitico Na Geral (do hilário Beto Hora), a rádio acabou com o inovador e inteligente Blog do Tas. Já se confunde o que é causa e o que é motivo na grave crise financeira que a rádio atravessa. Tudo vai muito provavelmente acabar na venda da frequência para a transmissão da programação da Bandeirantes AM no dial FM.

Deixo que você reflita e me diga o que, no meio disso tudo, é fluxo ou refluxo, tendência irreversível ou mera pedra no meio do caminho.



Nova-e

Quem disse que o Carnaval não pode ser produtivo? Aquele texto sobre a guerra, postado aqui na semana passada, saiu agora na revista eletrônica Nova-e. Passem lá pra dar uma olhada, a editoração ficou muito legal. E não deixem de mergulhar nos demais artigos da revista, sempre muito interessantes.



Eu já mandei pedir
à Odete,
pra me mandar
um chiclete de hortelã,
para tirar
esse cheiro de aguardente de romã
do Ceará.
Já cansei de implorar à minha irmã,
pra me mandar
um chiclete de hortelã.


Homenagem do saudoso Mussunzis à quinta-feira de cinzas.

sábado, março 01, 2003